As decisões sobre a vacina contra o HPV entre adolescentes e suas famílias vão muito além da simples conscientização ou do acesso. Segundo uma revisão recém-publicada pela Cochrane, essas decisões são influenciadas por uma rede de fatores sociais, culturais e relacionados à confiança.
Publicada em abril deste ano, a revisão Cochrane identificou oito grandes temas que moldam como cuidadores e adolescentes percebem e se envolvem com programas de vacinação contra o HPV. Para o Dia Mundial da Eliminação do Câncer do Colo do Útero, a equipe responsável pela revisão escreveu um novo blog voltado a apoiar profissionais de saúde pública a navegar por essas complexidades.
O papilomavírus humano (HPV) é uma família de vírus comuns, incluindo tipos que causam verrugas genitais e diferentes tipos de câncer em pessoas de todos os gêneros. O câncer do colo do útero, o quarto mais comum entre mulheres no mundo, é a neoplasia mais frequentemente associada à infecção pelo HPV. A vacinação de jovens é uma ferramenta poderosa para prevenir o câncer do colo do útero e outras doenças relacionadas ao HPV.
Apesar da introdução progressiva da vacina em muitos países, a cobertura vacinal contra o HPV permanece abaixo do ideal em vários contextos ao redor do mundo. Como os programas de vacinação dependem de altos níveis de cobertura para terem sucesso, compreender por que alguns adolescentes e seus cuidadores hesitam ou recusam a vacina é essencial para orientar políticas e intervenções mais efetivas.
Oito temas centrais que influenciam decisões sobre a vacinação contra o HPV
A revisão buscou construir uma compreensão abrangente dos múltiplos fatores que influenciam as percepções e práticas de cuidadores e adolescentes em relação à vacinação contra o HPV e por que alguns podem ser menos propensos a aceitá-la.
A revisão incluiu 206 estudos, dos quais 71 foram analisados. Esses estudos vieram das seis regiões da Organização Mundial da Saúde (OMS) e incluíram tanto cenários urbanos quanto rurais.
A revisão identificou uma série de fatores sociais, políticos, econômicos, estruturais e morais que influenciam como cuidadores e jovens percebem a vacinação contra o HPV. Esses fatores foram agrupados em em oito grandes temas:
- Conhecimento médico limitado sobre o HPV e a vacinação.
- Percepções de riscos e benefícios, incluindo preocupações com segurança e crenças morais sobre sexualidade.
- Atitudes gerais em relação às vacinas, moldadas por experiências anteriores com outras imunizações.
- Dinâmicas de tomada de decisão dentro da família, entre cuidadores e adolescentes.
- Influências sociais e comunitárias, incluindo colegas, família ampliada, líderes religiosos ou tradicionais e a mídia.
- Crenças e normas culturais relacionadas à adolescência, gênero, parentalidade e sexualidade.
- Confiança ou desconfiança em instituições, como escolas, governo, ciência e sistemas de saúde.
- Barreiras práticas para acessar a vacinação, incluindo custo, idioma e conveniência.
Esses fatores se entrelaçam de maneiras diferentes em distintos contextos e níveis de renda, mostrando que a hesitação vacinal raramente se explica apenas pela desinformação. Em vez disso, reflete contextos sociais, políticos e morais mais profundos nos quais as decisões de saúde são tomadas.
"Costuma-se presumir que, quando as pessoas decidem não se vacinar, é por falta de conhecimento ou conscientização", disse a Dra. Sara Cooper, autora principal da revisão da Cochrane South Africa. “No entanto, nossos achados sugerem uma relação mais complexa entre o conhecimento sobre a vacinação contra o HPV e sua aceitação.”
Agindo além da educação e conscientização
Os autores enfatizam que compreender as preocupações de pais e adolescentes sobre a vacinação contra o HPV, e as normas sociais e valores mais amplos dos quais essas preocupações fazem parte, é fundamental. Criar espaços para que essas dúvidas possam ser expressas e acolhidas com empatia pode ajudar a construir confiança e fortalecer a credibilidade dos programas de vacinação.
"Para acelerar o progresso rumo à eliminação do câncer do colo do útero, precisamos ir além das campanhas de conscientização. Construir confiança, compreender os enquadramentos morais locais e garantir acesso equitativo são essenciais para melhorar a adesão à vacinação contra o HPV em todo o mundo", afirma o Professor Charles Shey Wiysonge, autor sênior da revisão, da Cochrane South Africa.
Ao considerar esses fatores, formuladores de políticas e profissionais de saúde podem desenvolver estratégias de vacinação contra o HPV mais relevantes, socialmente aceitáveis e, em última instância, mais eficazes.